quarta-feira, 10 de fevereiro de 2010

Tese de doutorado na USP prova que racismo inventou tal "preguiça baiana"

A famigerada “manemolência” ou “preguiça baiana”, na verdade, não passa de uma faceta do racismo, segundo concluiu uma tese de doutorado defendida em setembro de 2009, pela professora de Antropologia Elisete Zanlorenzi (USP). A pesquisa que resultou na tese durou quatro anos. O estudo sustenta que o baiano é muitas vezes mais eficiente que o trabalhador das outras regiões do Brasil e contesta a visão de que o morador da Bahia vive em clima de “festa eterna”.

Pelo contrário, é justamente no período de festas que o baiano mais trabalha. Como 51% da mão-de-obra da população atua no mercado informal, as festas são uma oportunidade de trabalho. “Quem se diverte é o turista”, diz a antropóloga.

O objetivo da tese foi descobrir como a imagem da preguiça baiana surgiu e se consolidou. Elisete concluiu que a imagem da preguiça derivou do discurso discriminatório contra os negros e mestiços, que são cerca de 79% da população da Bahia. O estudo mostra que a elevada porcentagem de negros e mestiços não é uma coincidência. A atribuição da preguiça aos baianos tem um teor racista.

A imagem de povo preguiçoso se enraizou no próprio Estado, por meio da elite portuguesa, que considerava os escravos indolentes e preguiçosos, devido às suas expressões faciais de desgosto e a lentidão na execução do serviço (como trabalhar bem-humorado em regime de escravidão?).

Depois, se espalhou de forma acentuada no Sul e Sudeste a partir das migrações da década de 40. Todos os que chegavam do Nordeste viraram baianos. Chamá-los de preguiçosos foi a forma de defesa encontrada para desconstruir a imagem dos trabalhadores nordestinos (muito mais paraibanos do que propriamente baianos), taxando-os como desqualificados, estabelecendo fronteiras simbólicas entre dois mundos como forma de “proteção” dos seus empregos.

Elisete afirma que os próprios artistas da Bahia, como Dorival Caymmi, Caetano Veloso e Gilberto Gil, têm responsabilidade na popularização da imagem. “Eles desenvolveram esse discurso para marcar um diferencial nas cidades industrializadas e urbanas. A preguiça, aí, aparece como uma especiaria que a Bahia oferece para o Brasil”, diz Elisete.

Até Caetano se contradiz quando vende uma imagem e diz: “A fama não corresponde à realidade. Eu trabalho muito e vejo pessoas trabalhando na Bahia como em qualquer lugar do mundo”'. Segundo a tese, a preguiça foi apropriada por outro segmento: a indústria do turismo, que incorporou a imagem para vender uma idéia de lazer permanente. “Só que Salvador é uma das principais capitais industriais do país, com um ritmo tão urbano quanto o das demais cidades.”

Para tirar as conclusões acerca da origem do termo “preguiça baiana”, a antropóloga pesquisou em jornais de 1949 até 1985 e estudou o comportamento dos trabalhadores em empresas.

O estudo comprovou que o calendário das festas não interfere no comparecimento ao trabalho. O feriado de carnaval na Bahia coincide com o do resto do país. Os recessos de final de ano também. A única diferença é no São João (dia 24/06), que é feriado em todo o norte e nordeste (e não só na Bahia). Em fevereiro (Carnaval) uma empresa, cuja sede encontra-se no Pólo Petroquímico da Bahia, teve mais faltas na filial de São Paulo que na matriz baiana (sendo que o número de funcionários na matriz é 50% maior do que na filial citada).

Outro exemplo: a Xerox do Nordeste, que fica na Bahia, ganhou os dois prêmios de qualidade no trabalho dados pela Câmara Americana de Comércio (e foi a única do Brasil). Pesquisas demonstram que é no Rio de Janeiro que existem mais dos chamados “desocupados” (pessoas em faixa etária superior a 21 anos que transitam por shoppings, praias, ambientes de lazer e principalmente bares de bairros durante os dias da semana entre 9 e 18h), considerando levantamento feito em todos os estados brasileiros.

A Bahia aparece em 13° lugar. Acredita-se hoje (e ainda por mais uns 5 a 7 anos) que a Bahia é o melhor lugar para investimento industrial e turístico da América Latina, devido a fatores como incentivos fiscais, recursos naturais e campo para o mercado ainda não saturado. O investimento industrial e turístico tem atraído muitos recursos para o estado e inflando a economia, sobretudo de Salvador, o que tem feito inflar também o mercado financeiro (bancos, financeiras e empresas prestadoras de serviços como escritórios de advocacia, empresas de auditoria, administradoras e lojas do terceiro setor).

Fonte:Bahia de Fato

terça-feira, 2 de fevereiro de 2010

Trabalho intenso prejudica saúde dos professores

Pesquisa realizada pela Universidade de Brasília revela que os professores da rede pública DF estão cansados, doentes e trabalhando demais, inclusive para suprir deficiências da merenda escolar. Estudo feito em uma escola-classe de ensino fundamental (1ª a 4ª série) na Asa Norte mostra que o trabalho intensificado pelas mudanças no comportamento da sociedade e políticas públicas ineficientes prejudicam a saúde dos professores.
A dissertação A intensificação do trabalho docente na escola pública, defendida pela pedagoga Sandra Jaqueline Barbosa aponta que os pais transferem à escola o papel de educar seus filhos e as instituições não estão prontas para isso. “A famosa educação que vem de berço, não é mais o pai ou a mãe que dão, agora é função das escolas. Os pais estão mais preocupados em suprir necessidades materiais e acabam trabalhando muito”, explica a pedagoga.

Sandra verificou que os professores estão procurando auxílio no Sindicato dos Professores do Distrito Federal (Sinpro/DF) muito mais por causa da saúde do que para questões jurídicas. “Os professores estão apresentando sofrimentos psíquicos pela intensificação do trabalho”, explica a pesquisadora. Um dos diretores do Sinpro/DF, Ilson Bernardo conta que a demanda cresceu. “Tivemos que abrir um espaço para atender a saúde porque os casos extrapolam o que poderíamos considerar razoável”.

Outros problemas que intensificam o trabalho do professor são algumas funções administrativas acumuladas sem adicional financeiro, atitudes de desrespeito dos estudantes e seus familiares em relação à autoridade do professor, e ainda a obrigação de captar recursos para a escola, como organização de festas juninas. “A política de descentralização financeira propugnada pelos governos acabam em uma busca de alternativa pelos professores de arrecadação de recursos ”, explica Sandra Jaqueline.

Sandra conta que, sem esse esforço extra dos professores para captar dinheiro, até a merenda estaria ameaçada. A pedagoga conta que o governo repassa aos colégios alimentos básicos que seriam intragáveis. Por exemplo, quando chega o macarrão, ele não vem acompanhado de temperos. A saída é levantar dinheiro para comprar os temperos. Os professores acabam realizando trabalhos paralelos junto à comunidade que cerca a escola.

METODOLOGIA – Para realizar a pesquisa, Sandra entrevistou sete professoras, seis delas com mais de dez anos de experiência e uma com mais de sete anos sob o regime de contrato temporário. Começou seu trabalho em março de 2007 e defendeu sua dissertação em março de 2009. De maio a dezembro de 2008, Sandra Jaqueline acompanhou as atividades desenvolvidas na escola e realizou entrevistas com as professoras. Participou de reuniões de coordenação, reuniões com famílias, oficinas para confecção de material para a festa junina, oficina de música, atendimento a alunos com dificuldade de aprendizagem e outros trabalhos.

Outro ponto que contribui para o stress dos professores é a inclusão de alunos com necessidades especiais. Apesar de ser um ponto positivo para a sociedade – também seria para a escola – as instituições não estão preparadas para receber essa demanda. “Há pais que podem pagar algum ajudante para cuidar seus filhos. A escola não consegue dar suporte para todos os alunos inclusivos. O Estado tem de garantir essas condições”, explica Sandra. Na maioria das vezes, a escola tem apenas uma pessoa para acompanhar cerca de 19 alunos com alguma deficiência.

A pesquisadora diz que a saída seria uma reestruturação no sistema, como salas de aula com menos alunos, mais servidores para ajudar os alunos inclusivos, diminuição de carga horária dentro da classe ou aumento de horas para elaborar os projetos, definir as avaliações e serem capacitados. “Hoje em dia é muito trabalho e pouco tempo”, explica Sandra Jaqueline.

Publicado no www.vermelho.org.br

Fonte UnB